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O Grupo de Lima: pressão sem resultados na busca pela estabilidade venezuelana



Por Stephanie Braun Clemente*


O Grupo de Lima consiste num agrupamento de países que, desde 2017, vêm se reunindo esporadicamente com a finalidade de promover avaliações e monitorar a situação na Venezuela. O governo de Nicolás Maduro já não vinha sendo avaliado com bons olhos por grande parte da comunidade internacional ocidental, porém este quadro se agravou a partir do mês de agosto de 2017. A data de 08/08/2017 marca a decisão da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) venezuelana de aprovar um decreto por meio do qual os poderes públicos ficariam subordinados a ela. Essa decisão foi tomada como consequência do fato de que o Congresso venezuelano afirmava que passaria a não reconher as decisões da ANC, pois para este a Assembleia não teria legitimidade para legislar. Na prática, isso significa que a Venezuela passou a ter dois parlamentos. Esse evento foi de central importância para que vários atores internacionais começassem a apontar o governo de Maduro como um regime autoritário e ditatorial, que estaria se afastando dos princípios democráticos ocidentais.


Este teria sido o cenário que, segundo declaração oficial, fez com que países consternados com a situação decidissem se reunir para oficializar a ideia de que a oposição venezuelana estaria sendo coibida pelo governo. Nesse sentido, a partir de outubro de 2017 começaram a ser realizadas as reuniões do denominado Grupo de Lima, que declararam, dentre outros pontos, “sua decisão de não reconhecer os atos emanados da Assembleia Nacional Constituinte e reiteram seu pleno respaldo à Assembleia Nacional democraticamente eleita”.


A retórica usada pelo Grupo para falar sobre a Venezuela pode ser analisada a partir da frequência do uso de palavras e termos que mais aparecem em suas Declarações e Comunicados A partir disso, é possível então demonstrar o seu foco de atuação. O Grupo teria o compromisso de “contribuir para a restauração da democracia na Venezuela”, condenar os atos de violência que lá se passam, instar o governo venezuelano a cessar as violações aos Direitos Humanos e a libertar os presos políticos.


O apoio à figura de Juan Guaidó seria uma forma de realizar pressão política para que o governo de Maduro abdicasse do poder, permitindo que “eleições livres, transparentes e democráticas” fossem realizadas.

Nesse sentido, se mostram preocupados com o “êxodo de milhares de venezuelanos” que representaria “um enorme desafio para os países da região”. Assim, se colocam na disposição de apoiar esforços de negociações e de “adotar novas sanções ou outras medidas econômicas e políticas contra o regime de Maduro”. Destarte, concordam em instar outros Estados da comunidade internacional a adotar medidas semelhantes contra o regime de Nicolás Maduro e em prol da democracia.


Desde janeiro de 2019 reconhecem o Presidente da Assembleia Nacional Juan Guaidó, que se autoproclamou em 25/01/2019 Presidente da República Bolivariana da Venezuela “em face da ilegitimidade do regime Nicolás Maduro”. Para findar tal situação de crise na Venezuela, acreditam que “só os venezuelanos podem encontrar a solução para a grave crise que afeta esse país” e defendem que seja realizado um acordo negociado entre ambas as partes, rechaçando “qualquer curso de ação ou declaração que implique uma intervenção militar”.


Imagem 1: Frequência de Palavras nas Declarações do Grupo de Lima


Imagem 2: Frequência de Palavras nos Comunicados do Grupo de Lima

Fonte: Elaboração própria realizada no software Nvivo, a partir das Declarações e Comunicados do Grupo de Lima disponíveis no site do Ministério das Relações Exteriores (MRE).


Ademais, a partir da análise das declarações e comunicados do Grupo de Lima, alguns pontos podem ser ressaltados. Por um lado, que suas decisões não possuem caráter vinculante para seus membros. Até determinado momento, México e Argentina participavam dos encontros do Grupo, porém a partir das reuniões de 04/01/2019 e 05/01/2020, respectivamente, sua presença não é mais registrada. Tais países passaram por mudanças em sua orientação política com as ascensões de Manuel López Obrador e Alberto Fernández à presidência. Esta inflexão fez com que o alcance e a representatividade do Grupo fosse reduzida, já que aqueles são Estados que têm um peso grande na região. Somado a isso, os Estados Unidos somente participaram de uma das reuniões, não estando presentes nas reuniões posteriores. Ainda assim, tiveram um papel primordial na situação venezuelana, principalmente devido às questões comerciais com o país.


Observa-se ainda que os encontros foram majoritariamente realizados nos anos de 2018 e 2019, momento em que pode ser percebida uma maior pressão internacional para condenar a conduta do governo. Em 2020 houve, até o momento, apenas 3 reuniões. Nelas, o Grupo demonstrou sua preocupação com os efeitos que a pandemia traria para o agravamento da crise no país, prevalecendo a noção de que pressionar para que o governo abandone seu posto agora prejudicaria ainda mais a situação da população. Por outro lado, a conjuntura internacional atual também incorpora a problemática de que um dos Estados que mais fazem pressão para que Maduro abdique de seu cargo, os Estados Unidos, estão em momento de campanha eleitoral, e o candidato Trump, muito antipático a Maduro, pode não ser reeleito.


O Grupo de Lima configura então um mecanismo que se organiza multilateralmente, com a finalidade de realizar, em alguma medida, pressão internacional para que o bolivarianismo seja por fim superado no país latino-americano. O apoio à figura de Juan Guaidó seria uma forma de realizar pressão política para que o governo de Maduro abdicasse do poder, permitindo que “eleições livres, transparentes e democráticas” fossem realizadas. Porém, atualmente a figura de Guiadó já não se mostra tão forte frente à crescente divisão dentro das bases da oposição, que tem se revelado ainda mais difusa com as negociação de alguns desses grupos, representados por Henrique Capriles, com o Palácio de Miraflores. E os esforços realizados até aqui pelo Grupo acabaram se limitando à retórica, afinal este não conseguiu planejar uma saída real para a crise do país, não promovendo um diálogo entre o governo e a oposição para chegarem a um acordo concreto.

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* Stephanie Braun Clemente é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

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